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STJ veda leilão de bem imóvel por valor inferior a 50% da avaliação

  • Foto do escritor: Equipe Sergio Schmidt Advocacia
    Equipe Sergio Schmidt Advocacia
  • 4 de nov.
  • 4 min de leitura
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Em mais uma decisão que redefine as regras dos leilões extrajudiciais de imóveis, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a arrematação não pode ocorrer por "preço vil", mesmo nos casos regidos pela Lei do Sistema Financeiro Imobiliário (Lei n. 9.514/1997).


A Corte Superior deu parcial provimento a um recurso (AgInt no AResp Nº 2165101 - PR) para anular a venda de um imóvel que, embora arrematado por valor superior ao da dívida, representava apenas 39,8% do valor de avaliação.


O caso em questão envolvia um imóvel no Paraná, avaliado em R$ 870.993,08, que foi arrematado em segundo leilão por R$ 346.400,00. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) havia validado o leilão, argumentando que a lei especial (Lei n. 9.514/1997) permite, no segundo leilão, a venda por qualquer lance, desde que igual ou superior ao valor da dívida, que no caso era de R$ 266.400,00.


Contudo, o relator do caso no STJ, Ministro Marco Buzzi, reconsiderando decisão anterior, acolheu o argumento dos devedores. O ministro destacou que a conclusão do tribunal de origem estava "em dissonância com a jurisprudência da Corte Superior".


Segundo o STJ, embora o Art. 27, § 2º, da Lei nº 9.514/97 autorize a venda pelo valor da dívida, a arrematação não pode ser feita por preço vil. A jurisprudência do STJ define "preço vil" como qualquer valor inferior a 50% (cinquenta por cento) da avaliação do imóvel, sob pena de "causar um prejuízo exagerado em desfavor do devedor fiduciante".  Como o valor da arrematação (R$ 346.400,00) foi inferior à metade da avaliação (R$ 870.993,08), o STJ caracterizou a venda como preço vil.


 

A Solução: Complementação do Preço

Apesar de reconhecer a nulidade da arrematação por preço vil, o STJ não determinou o simples desfazimento do leilão. Citando precedentes, a Corte optou por uma solução que protege o arrematante de boa-fé.


A decisão final foi dar parcial provimento ao recurso para "determinar a intimação do arrematante para que, querendo, proceda à complementação do valor ofertado", com as devidas correções, para que o montante atinja o percentual mínimo exigido por lei (50% da avaliação). Caso o arrematante não complemente o valor, a arrematação será desfeita.


 

Análise da decisão e seus impactos

As decisões do STJ no AResp 2165101 e precedentes representa uma mudança significativa na interpretação da Lei do Sistema de Financiamento Imobiliário, com potencial para gerar forte impacto no mercado imobiliário e em outras áreas do direito.


1. A sobreposição da regra geral (CPC) sobre a regra especial (Lei 9.514/97)

O ponto central da decisão é que o STJ fez a regra geral do Código de Processo Civil (CPC), que veda o preço vil, prevalecer sobre a regra específica do Art. 27, § 2º da Lei 9.514/1997. A lei especial, pilar do financiamento imobiliário, autorizava a venda em segundo leilão pelo valor da dívida, independentemente da avaliação.


Ao decidir que o devedor não pode sofrer um "prejuízo exagerado" e invocar princípios como a vedação ao enriquecimento sem causa e a execução menos gravosa, o STJ sinaliza que as normas processuais gerais de proteção patrimonial se sobrepõem à mecânica específica da lei de financiamento.


2. Insegurança para arrematantes

A decisão cria um novo foco de risco para investidores e arrematantes em leilões. Anteriormente o arrematante se sentia seguro ao adquirir um imóvel por valor superior ao da dívida, conforme ditava a lei especial. Agora, esse mesmo arrematante pode ser obrigado a complementar o preço para atingir 50% da avaliação ou ter sua aquisição desfeita. Isso introduz uma insegurança jurídica que pode diminuir o interesse em leilões extrajudiciais, afetando a liquidez e a recuperação de crédito.


3. O problema para as instituições financeiras

O impacto não se limita ao arrematante. As próprias instituições financeiras passam a enfrentar um novo desafio. Se o valor da dívida for inferior a 50% da avaliação do imóvel, o banco fica em uma posição delicada. Mesmo que a instituição consolide a propriedade em seu nome (quando não há lances no leilão), a lógica da decisão — proteção contra o preço vil e o enriquecimento sem causa — poderia ser usada pelo devedor para questionar a própria consolidação, exigindo uma compensação ou "acerto de contas" que limite o prejuízo do devedor.


4. A ameaça se estende à Lei de Falências?

Esta é talvez a implicação mais profunda. O STJ usou regras gerais do CPC para suplantar uma regra específica da Lei 9.514/1997. Se esse racional for mantido, ele pode "transcender" para outras áreas.


Um exemplo crítico é a Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei 11.101/2005). O Art. 142, § 3º-A, inciso III dessa lei, autoriza expressamente a venda de bens da massa falida por valores inferiores a 50% da avaliação em determinadas circunstâncias (quando não há compradores no segundo leilão com oferta superior a 50% da avaliação).


Se o STJ entendeu que a regra geral do CPC (vedação ao preço vil) protege o devedor fiduciante, é plausível que o mesmo tribunal possa, no futuro, entender que essa mesma regra geral do CPC deve ser usada para proteger a "massa falida". O argumento seria que a venda de ativos por valores muito baixos, embora permitida pela lei especial de falência, configuraria um prejuízo à coletividade de credores (a massa falida), justificando a aplicação da regra geral contra o preço vil.


Para conhecer a íntegra da decisão, acesse o arquivo a seguir:


 
 
 

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